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Ferryboat

i

Aprontei minhas coisas e saí da estação como se sai de um sonho. Ou foi o que sonhei. Ou foi o que sonhei que sonhei. A verdade é que desde que tomei este percurso à Polônia pareço ter me encontrado num estado em que o tecido da realidade, com uma sutileza quase imperceptível, parece torcer-se ou como se tudo o que há movesse-se um centímetro ou um milímetro para trás ou para cima ou como se os olhos de minha amada Jessie, que tanto disfarçou a sua indiferença desde quando a comuniquei, meses atrás, sobre o convite de Józef para que visitássemos a velha Pátria, pátria essa que, para Jessie, não tem brio da Inglaterra, não tem o poderio, não tem a classe da Inglaterra, mas que mesmo assim, desde o convite, manteve um sorriso no rosto, “O ar do continente te fará muito bem, meu amor”, me disse, “As crianças vão adorar, meu amor”, também me disse, “Será uma aventura”, como se os olhos de minha amada Jessie, tão cúmplices em disfarçar os seus sentimentos e ao mesmo tempo tão verdadeiros em me iluminarem que disfarçam seus sentimentos, como se seus olhos, logo após embarcamos na plataforma em Berlim, logo após nos sentarmos em nossa cabine, após tomarmos café e Józef terminar de ler seu jornal e nos dizer que um nobre qualquer tinha sido assassinado para o morno fascínio de todos, como se esses olhos, tão cúmplices, logo após aquele momento, me escondessem algo a mais do que a sua aversão pela minha Polônia, algo que, poderia dizer-se, se escondiam nos olhos dela mas não com ela, que se escondia inclusive dela. Como se esse estado que me toma a alma fosse fruto daquele ato inconsequente (embora inconsequente não seja bem a palavra) do qual, a um primeiro momento, me parecesse asquerosamente indiferente.

A partir daquele instante, a aprazível viagem que reservava o direito a rever o velho mar, a rever as exóticas bestas que passeavam pelas jaulas do zoológico de Hamburgo, com direito a uma boa noite de sono em Berlim e uma manhã tranquila na estação, daquele momento em diante, torcia-se lentamente de modo que, enquanto a maioria de nós, sentados naquela cabine, ansiava por uma viagem no espaço, senti surgir em meu coração uma sensação difusa de que o que havia começado, para mim, era uma viagem no tempo, para o passado.

Lembro com estranha clareza de Józef me perguntar, após explanar sobre as aspirações e complôs balcânicas, o que eu achava que aconteceria após a morte daquele arquiduque em Saraievo e com a mesma clareza me lembro de respondê-lo com a mais perfeita sinceridade: “Nada”. E tendo uma grande repugnância em considerar o assassinato como um fator político, rejeitei o assunto.

Quanto mais nos aproximávamos da Cracóvia, onde deixei de ser criança, conheci as amizades, as admirações, os pensamentos e as indignações daquela época; onde comecei a entender a vida, formar afetos, acumular lembranças; onde cresci sob a égide dos hinos de Adam Mickiewicz e Zymunt Krasiński pelo amor a meu pai e pelo seu amor à pátria e onde passei com meu amado pai seus últimos meses de vida, quanto mais nos aproximávamos daqueles muros históricos mais me invadia aquela bizarra sensação que paulatinamente tomava a minha cabeça, os meus braços, o meu peito, as minhas pernas e quando não restava mais corpo que tomar invadiu a cabine, a risada de Jessie, o charuto de Józef, o chapéu de Otolia e mesmo a inocência de Borys e a valentia de John e invadiu todo o trem e tudo o que existia até aonde a vista alcançava com uma experiência de um mundo outro: a Polônia de então se apagava do mapa e passava a existir numa realidade outra na mesma medida em que o meu eu de então se apagava do mapa e que caía sobre mim um sonho afável que me tirava do mar — que tanto anos me teve sobre suas ondas — e me tirava de Londres — onde há muitos anos passei a adotar como lar — e me tirava até mesmo a fala, ou melhor, a língua inglesa — a qual ao longo dos anos se apossou-me tantos dos livros, das cartas, das conversas íntimas e até do meu nome — e me voltava ao chão imaturo da Cracóvia e voltava-me à boca o polonês dos poetas de minha infância e, por fim, me voltavam os braços e o peito e as pernas e cabeça dos meus longínquos anos de mancebo de modo que, quando aprontei as minhas coisas e saí da estação, talvez não tenha saído como se sai de um sonho, mas como se entra em um. Lá estava. Parado frente a estação. Volto novamente um órfão que espera que o recepcionem, que é levado com palavras gentis de condolências ao carro, que espia pela janela a Cracóvia se distanciar quanto mais se aproxima Lviv, que chega a passos tímidos no internato, que rubra as bochechas ao conhecer o diretor da escola e que, ao se jogar ao final dessa odisseia juvenil sobre a cama, faz exatamente o que faria qualquer garoto de 14 anos órfão de mãe aos 8 e agora também de pai. Chora.

ii

Em Lviv o tempo é lento e melancólico. Entre a rotina das aulas, os empurrões e desavenças com os demais garotos pelos pátios e corredores, entre os momentos cercados de livros e, como não notar, a solidão, o tempo parece se distender em uma eternidade.

Não que nesse período eu não tenha tentado me livrar desse indelével sonho, de me desvencilhar dessa realidade impossível ao jurar para quem pudesse me ouvir que tudo isso não passa de um grande engano, que apesar de parecer um garoto órfão à espera de concluir sua educação — e de quiçá tê-lo sido num dia já imemorável — eu não mais pertenço a esse mundo infantil mas ao dos escritores reconhecidos, dos capitães da marinha, dos pais e o dos homens da Inglaterra. Em vão. Tudo o que podem escutar, estes professores altivos e condescendentes, são apenas ânsias de um garoto que sonha. Mas a miragem que me prende não é essa que apontam senão esta que vivo, dia a dia, como um falso idílio.

Não fosse a doce presença de Tekla Syroczynska para aplacar minhas constantes dores de cabeça não consigo imaginar o que seria de mim. “O ar te fará melhor”, costuma me dizer todas quintas e domingos quando vem me tirar de casa para passearmos pelas ruas da cidade. “As demais crianças vão adorar” me diz com generosidade após me escutar com interesse e mesmo não acreditando em meu relato como os demais, ter a gentileza de incentivar o meu “sonho” de ser escritor que me fez retomar a pluma e escrever uma singela comédia apesar da peça ser incompreensível para os meus torpes companheiros que se recusam a encená-la. Não fosse as suas faces rosadas, a sua silhueta esbelta, o seu sorriso comedido e o seus olhos de intenso azul a me distrair com seu imperceptível segredo que teima a se revelar mas que sinto como algo perdido há muito ou talvez pouco, como uma gema preciosa que por tamanho cuidado com o delicado objeto me fugisse das mãos, se debatesse pelo convés, escorresse para o mar e aí se afundasse vagarosamente…

“Há de haver uma saída desse pesadelo”, pensava comigo mesmo, “há de se resistir ao canto das sereias. Há de existir uma rota de volta à minha amada terra e meu amado mar e minha amada pátria e meus amados livros e aos braços de minha amada família”. Assim que por vários meses busquei razão para compreender como cheguei a esta forma para que, no processo de entender, pudesse também chegar a uma resposta em como fugir. Li livros, busquei a sabedoria dos maiores, debati e me debati com as hipóteses que, no fundo, sabia não serem verdade: estaria no inferno? Seria essa uma punição divina por algum mal cometido? Seria tudo isso um sonho ou talvez algum tipo de magia? Nenhuma conclusão me veio. Igual se viesse. Se isto realmente fosse o inferno, um sonho, uma maldição ou uma punição, não sabia o que fazer.

O desalento já tomava meu espírito, a gema, afundando lentamente nas águas escuras, parecia quase perdida quando Tekla me trouxe, numa tediosa tarde de primavera, notícias de um evento aparentemente banal: “dizem que chegará à Polônia um grande escritor há muito exilado da pátria. Parece que escreve sobre o mar e transatlânticos, como você”.

Seu sorriso cúmplice me fez gelar a alma.

“Poderia ser…” me assaltou o pensamento que resisti a completar com um medo mortal das consequências.

“É uma aventura”, me diz tomando com satisfação um longo sorvo de chá.

“Poderia ser …

iii

… só uma coincidência”.

A cena se desenhava com monstruosa curiosidade desde o princípio: impelido à varanda pela falazada da senhora Juvenal, me dedicava a fumar passivamente enquanto admirava o horizonte ganhar perspectivas mais azuis com a proximidade da noite até o momento em que pressenti que sobre mim se agrandava um olhar fugidio, mas intenso.

De fato, no canto da rua se escondia mal um garoto, algo por seus 15 anos, que ao perceber que o percebera, congelou-se num breve momento, entre a hesitação da abordagem e uma desprevenida fuga.

O rapaz, um tanto mais feio do que intui na escuridão de seu esconderijo, se aproximou a passos vacilantes e ao escrutinar-me a face senti que buscava desesperadamente nela uma resposta que lhe desse o menor raio de luz que iluminasse os contornos do seu futuro. A frustração, tão comum quando me olham a cara, nessa vez também não falhou:

O rapaz ensaia uma resposta, mas seu corpo murcha e pela boca se ouve exalar apenas um “Você não entenderia”. A noite segue se aproximando na mesma velocidade que o cigarro queima entre meus dedos.

Com a última tragada vem a linha da escuridão a confundir a geometria do horizonte.

Com um ar pensativo, o garoto começa a girar os polegares, e como que realizando uma complicada fração matemática o garoto gira os polegares enquanto tateia, como se estivesse num quarto escuro onde você não tem ideia no que vai quebrar o pescoço, o garoto gira os polegares e tateia em busca de uma luz até que, girando os polegares, o garoto diz:

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